Autor: Gean Carlo Azinari
Editora: Vanessa Resende Souza Silva
A doença de Alzheimer (DA) é um distúrbio
neurodegenerativo do cérebro que pode afetar diversos processos da função
mental, como a memória, o pensamento, o comportamento e a capacidade de
executar tarefas comuns do dia a dia, sendo reconhecida como a causa atual mais
comum de demência. Foi descrita inicialmente em 1906 pelo psiquiatra e
neuropatologista alemão Alois Alzheimer, e estima-se que afeta atualmente cerca
de 46 milhões de pessoas pelo mundo todo, podendo esse valor ser dobrado a cada
20 anos. A doença possui um caráter progressivo, irreversível, e costuma afetar
pessoas com mais de 65 anos, porém pode também se manifestar em faixas etárias
inferiores. O diagnóstico definitivo para Alzheimer costumava ser difícil e só
era realizado com base em uma biópsia do tecido cerebral, ou através de lâminas
de histopatologias, porém, este cenário vem mudando com o aumento das
tecnologias disponíveis de imagem e análise, que fornecem um diagnóstico mais
preciso, certeiro e precoce, permitindo ao paciente iniciar um tratamento antes
do avanço da doença.
Fisiopatologia
O mecanismo patológico básico desta doença está
relacionado com a mudança na conformação de duas proteínas que são produzidas
normalmente em nosso cérebro, o peptídeos amiloide-beta (Aβ), e a proteína Tau,
que por se apresentarem de uma forma ineficiente podem levar ao desenvolvimento
de distúrbios decorrentes da ausência de suas funções celulares, e ao
aparecimento da Doença de Alzheimer.
Os agregados do peptídeo Aβ podem formam placas
neuríticas, que são placas neurotóxicas formadas por fragmentos da clivagem
incorreta da proteína precursora amiloide, e podem ser vistas através de
microscópio óptico por diversas colorações, servindo deste modo como um marcador
histológico da doença de Alzheimer. Além das placas neuríticas, são observadas
também diversas alterações microvasculares cerebrais, que são comumente vistas
em outras neuropatologias, como no acidente vascular cerebral.
A proteína Tau é uma proteína citoplasmática cuja
função está relacionada com a regulação do transporte axonal, participando
também da montagem e estabilidade dos microtúbulos, que são proteínas
estruturais de alta importância para o funcionamento dos neurônios. A
fosforilação da proteína Tau em domínios específicos modula suas funções intracelulares,
porém, uma fosforilação excessiva dissocia-a dos microtúbulos do esqueleto
neuronal, levando a desestabilização dessas proteínas e formação de filamentos peptídicos
em forma de hélice, que podem inclusive interferir na função de outras
proteínas Tau normalmente fosforiladas.
Alzheimer
e o sistema imunológico
O sistema imunológico maduro de um ser humano adulto é
capaz de neutralizar e eliminar tais proteínas aberrantes responsáveis pela
ocorrência da doença de Alzheimer, porém, esta vigilância fisiológica decai com
o avanço da idade do paciente através de um mecanismo natural conhecido por imunosenescência, ou envelhecimento do
sistema imunológico, que coincide com o aparecimento da doença de Alzheimer.
Atualmente, as opções de tratamento disponíveis no mercado são limitadas a
reduzir os sintomas associados aos problemas cognitivos, não impedindo de fato o
progresso da doença, existindo assim a necessidade de uma intervenção que vise
atuar nas causas patológicas da doença, e não apenas nas consequências por ela
produzidas. Deste modo, surge a ideia da imunoterapia, uma forma de imunização
que pode ocorrer basicamente de duas formas, ativa e passiva.
Imunoterapia
ativa
A imunização ativa se baseia na administração de um
composto vacinal formado por um antígeno e um adjuvante, visando a ativação do
sistema imunológico e promoção de resposta celular e humoral, comandado pelos
linfócitos T e B respectivamente. Este tipo de imunização estimula a produção
de anticorpos pelas células plasmocitárias – células produtoras de anticorpos –
para que as proteínas aberrantes possam ser eliminadas, ou até mesmo dirigidas
para fora do Sistema Nervoso Central, aumentando assim a depuração destes
elementos. Teoricamente, este tipo de imunoterapia poderia retardar a
inflamação local, e reduzir a ligação da proteína Aβ com outras proteínas
saudáveis, evitando assim a neurotoxicidade, porém, como a reação imunológica é
desenvolvida pelo próprio organismo vacinado, estes anticorpos podem atuar em
tecidos saudáveis próprios, desenvolvendo uma resposta autoimune inflamatória
que pode ser danosa para o cérebro, limitando um pouco sua aplicação.
Imunização passiva
A imunização passiva é atualmente o método mais
promissor para regressão da doença de Alzheimer, e se baseia na injeção direta
intravenosa de anticorpos monoclonais pré-formados, ou de anticorpos
policlonais derivados de um doador, visando assim o não desenvolvimento de uma
resposta autoimune. Este tipo de imunização tem como objetivo a redução do
conteúdo amiloide do cérebro de pacientes doentes através de diversas
abordagens, tais como: inibição da agregação amiloide, facilitação da
fagocitose do conteúdo amiloide por células da micróglia e ligação dos
anticorpos ao conteúdo amiloide plasmático, gerando um gradiente de
concentração que provoca um efluxo deste conteúdo para fora do Sistema Nervoso
Central. Porém, este método de imunização é mais custoso, uma vez que requer a
pré-produção destes anticorpos e exige a administração de injeções mensais,
tornando-se assim menos prática e mais dispendiosa.
Desafios
Embora o campo de estudo da imunoterapia tenha se
desenvolvido muito nos últimos anos, o trabalho envolvendo este tipo de
abordagem ainda apresenta alguns desafios que necessitam ser ultrapassados. Apenas
uma pequena parcela dos anticorpos produzidos na imunoterapia conseguem de fato
atravessar a barreira hematoencefálica, sendo necessário o surgimento de novas
formas de penetração deste material no cérebro. Além disso, a patogênese do
Alzheimer se inicia décadas antes do surgimento dos sintomas clínicos,
influenciando diretamente no sucesso da terapia. Deste modo, o diagnóstico
definitivo ainda necessita de melhorias em sensibilidade e estabilidade, para
que a doença possa assim ser prevenida, ou precocemente tratada. Para isto, é
necessário que novos estudos sejam executados cada vez mais, de forma a
futuramente ser prevenida, ou tratada a doença de Alzheimer.
Referências:
HAYAT, M. A.. Immunology: Immunotoxicology, Immunopathology, and
Immunotherapy. Unied
States: Academic Express, 2018. 286 p.
SANTOS, Joana Margarida Silvestre
da Costa. Imunomodulação no tratamento na doença de Alzheimer. 2018. 35 f.
Monografia (Especialização) - Curso de Farmacologia, Faculdade de Farmácia da
Universidade de Coimbra, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2016.
FULOP, Tamas; PAGE, Aurélie y Le; FROST, Eric H. Role of the innate
immune response in the progression of Alzheimer’s disease. The Journal Of
Immunology. Canada, p. 27-55. 1 de maio de 2017. Disponível em:
<http://www.jimmunol.org/content/198/1_Supplement/55.27>.Acesso em 21 de
outubro de 2018.
Nenhum comentário:
Postar um comentário