terça-feira, 1 de agosto de 2017

Vacinação obrigatória contra febre aftosa: uma reflexão

Por: Msc. André Madeira Silveira França (PMU)
Editora: Flávia Batista Ferreira (Doutoranda/UFU)

A febre aftosa é uma doença viral de caráter contagioso provocada por vírus da família Picornaviridae, gênero Aphthovirus, que acomete animais biungulados, incluindo os bovinos. Apesar de ser uma zoonose com raros casos em humanos e de não apresentar grandes riscos à saúde pública, a epidemiologia desta doença revela uma elevada morbidade dentro do rebanho bovino, levando a severas perdas de produtividade durante a presença dos sinais clínicos. Além disso, a ocorrência de casos da febre aftosa leva ao sacrifício obrigatório dos bovinos de um rebanho ou da região acometida, proibição de vendas e exportações e perdas econômicas elevadas, muitas vezes irreparáveis. Assim, a preocupação com tal doença dá-se principalmente pelos prejuízos financeiros que a acompanham.
Apesar de não ocorrer nenhum caso notificado de Febre Aftosa no Brasil desde 2006, em grande parte dos territórios são realizadas uma ou duas campanhas obrigatórias de vacinação no rebanho bovino, determinadas pelo Programa Nacional de Erradicação e Prevenção da Febre Aftosa. Aí entra uma questão que é alvo de discussão entre os envolvidos na cadeia da bovinocultura: as reações vacinais. Estas nada mais são do que formações de resposta imunológica a componentes vacinais, seja decorrente do veículo oleoso do produto/adjuvantes, ou de contaminação da agulha ou medicamento. Como consequências negativas deste processo, há o desconforto do animal causado pela dor, afetando diretamente o bem-estar e consequentemente a produtividade e, nos abatedouros, a necessidade de remoção da musculatura acometida pela reação vacinal, incluindo margem de segurança para evitar contaminação da carcaça e dos instrumentos de trabalho (facas e ganchos).  
Estima-se que a remoção dos “caroços” (abscessos) durante o abate comercial representa até 2kg de carne por animal. Se considerarmos que a quase totalidade dos bovinos abatidos possuem reações vacinais, é possível imaginar o tamanho do prejuízo para os pecuaristas, visto que estes arcam com as perdas. Neste momento, é possível realizar-se uma reflexão: como é possível a vacinação de uma doença que pode causar tantos prejuízos econômicos para os produtores, causar tantos prejuízos econômicos aos produtores? Parece engraçado, mas não é.
O importante, além da conscientização dos produtores quanto à aplicação das boas práticas no processo de vacinação, é reavaliar todos os procedimentos envolvidos. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) já estuda reduzir a dose de 5ml para 2ml, alteração da composição da vacina sendo removido o sorotipo C do vírus inativado devido a este não ser encontrado na América do Sul (fabricação de uma vacina bivalente com o vírus O1 e A24 inativado), retirada do adjuvante oleoso da composição da nova vacina. Existe também uma expectativa de retirar totalmente a vacina até 2023, assim que houver reconhecimento do Brasil como zona livre da doença sem vacinação pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE). Tais medidas foram anunciadas recentemente, possivelmente estimuladas pela suspensão de compra de carne in natura brasileira pelos Estados Unidos, após ser encontrada reação vacinal (abscessos) em uma das carcaças exportadas.

Pra finalizar, em condições de campo, é comum a compra da vacina pelos pecuaristas apenas para comprovar uma suposta vacinação, descartando-se as vacinas e apresentando as notas fiscais de compra aos órgãos competentes. Assim, são notórias diversas falhas em todos os setores envolvidos com a Febre Aftosa, passando pelas indústrias (farmacêutica e alimentícia), produtores e órgãos competentes. Como a vacina contra uma doença, e não a doença em si, torna-se um problema tão grande para um país que está prestes a ser considerado livre da doença a qual ela protege? O dinheiro ou a saúde pública, qual deles vai ser levado em consideração ao final das contas? A doença não existe ou não foi identificada? E se fosse identificada, a vacinação seria a heroína ou a vilã?

Reação vacinal em músculo Longissimus dorsi bovino.
Fonte: skywatchbretten.blogspot.com.br/2012/08/nie-wieder-fleisch-arte-dokumentation.html

LYRA, T.M.P.; SILVA, J.A. A febre aftosa no Brasil 1960-2002. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.56, 2004

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