terça-feira, 29 de agosto de 2017

Edição gênica utilizando CRISPR/Cas9

Por: Patrício da Silva Cardoso Barros (Doutorando/PPIPA)
Editor: Heber Leão Silva Barros (Doutorando/PPIPA)

A estrutura dos organismos e seus ativos processos fisiológicos são baseados praticamente em proteínas. A informação genética para a síntese dessas proteínas, está armazenada no DNA.  Uma molécula de DNA é composta por dois filamentos enrolados numa longa fita dupla hélice. Cada um dos filamentos da dupla hélice consiste num arcabouço feito de cópias repetidas de um açúcar (chamado desoxirribose) e fosfato. De cada grupo açúcar-fosfato, projeta-se uma base nucleotídica. Devido ao espaço ocupado pelas bases, a adenina sempre pareia com a timina (duas pontes de hidrogênio), enquanto guanina pareia com a citosina (três pontes de hidrogênio). As diferentes combinações entre as bases dão origem ao código genético, contendo as informações necessárias para a síntese das estruturas celulares. A habilidade de modificar as sequências do código genético é fundamental para o desenvolvimento de ferramentas para aplicações clínicas e biotecnológicas.
Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats (CRISPR) é um mecanismo de defesa natural que faz parte da imunidade adaptativa de alguns procariotos. CRISPR é utilizado por muitas bactérias para se protegerem de infecções causadas por elementos genéticos exógenos como vírus, bacteriófagos e plasmídeos. Essa ferramenta foi adaptada permitindo a edição (com alta especificidade) de qualquer genoma.

Quais são as inovações do CRISPR e por que essa ferramenta é tão importante? Primeiro, CRISPR não faz nada completamente novo. Os cientistas desenvolveram ferramentas para a edição gênica há algum tempo. O que o CRISPR faz é tornar a edição de genes incrivelmente mais fácil e mais barata. CRISPR permite a inserção, substituição e deleção de sequencias gênicas no genoma. Esse fato, por exemplo, o torna capaz de corrigir mutações no genoma que causam doenças. Existem várias subclasses de CRISPR, mas o sistema do tipo II (CRIPR/Cas9) é o mais utilizado.


Funcionamento de CRISPR/Cas9:
CRISPR possui dois componentes:
1-      RNA guia (gRNA) - sequência de ~20 pares de base que define o sítio especifico do genoma a ser modificado. O gRNA pode ser qualquer sequência de ~20 nucleotídeos presente no genoma, desde que dois pré-requisitos sejam respeitados:
I.                   Essa sequência não pode ter outra repetição/homologia no genoma.
II.                A sequência alvo deve se encontrar imediatamente antes de um Protospacer Adjacent Motif (PAM). No caso do sistema do tipo II, o PAM é NGG (um nucleotídeo qualquer seguido por duas guaninas). É possível modificar o loci alvo apenas alterando a sequência do gRNA.
2-      Endonuclease associada à CRISPR (Cas9) – responsável pela quebra da dupla fita do DNA (DSB), que possibilita a edição gênica.
Esses dois componentes devem ser simultaneamente introduzidos na célula a ser modificada. O complexo gRNA/Cas9 se liga a todas as sequências PAN do genoma, mas a Cas9 apenas gera quebra na dupla fita do DNA quando o gRNA se parear (por homologia) com a sequência alvo no genoma. A DSB gerada pela Cas9 pode ser reparada por uma das duas vias, que operam em praticamente todos os organismos:
1-      Non-Homologous End Joining (NHEJ) - é o mecanismo de reparo mais ativo e responsável pela maior parte do reparo gênico. No entanto, esse reparo do DNA ocorre pela adição ou deleção de nucleotídeos (inDels) no sito da quebra. Esses pequenos indels destroem a organização in frame (códons) dos aminoácidos e geralmente resultam na formação de um Stop códon prematuro, que bloqueia a tradução.
2-      Homology Directed Repair (HDR) - ao contrário da via NHEJ o reparo via HDR pode ser utilizado para a edição gênica com alta especificidade e fidelidade, permitindo modificações de um único nucleotídeo bem como inserções de longas sequências de nucleotídeos (como gene de resistência e TAGs). 
Apesar da sua recente adaptação para o uso em pesquisa, CRISPR já revolucionou completamente a forma como editamos o genoma. O futuro com CRISPR será promissor.

Referências:
CONG, L.; RAN, F. A.; COX, D.; LIN, S.; BARRETTO, R.; HABIB, N.; HSU, P. D.; WU, X.; JIANG, W.; MARRAFFINI, L. A.; ZHANG, F. Multiplex genome engineering using CRISPR/Cas systems. Science, v. 339, p. 819-823, 2013.
HORVATH, P.; BARRANGOU, R. CRISPR/Cas, the immune system of bacteria and archaea. Science, v. 327, p. 167-170, 2010.
SHALEM, O.; SANJANA, N. E.; ZHANG, F. High-throughput functional genomics using CRISPR-Cas9. Nature reviews Genetics, v. 16, p. 299-311, 2015.

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