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por Marcela Davoli (Doutoranda FMRP-USP/IBA)
Editora:
Caroline Mota (PostDoc UFU/PPIPA)
Trilhões
de micróbios, incluindo bactérias, alguns tipos de fungos e até parasitos,
habitam o corpo humano e coletivamente são chamados de microbiota. Estima-se que nosso corpo seja composto por 10 vezes
mais micróbios do que células humanas. Em outras palavras, quanto ao número de
células, somos 90% micróbios e apenas 10% humanos! Embora esses microrganismos
colonizem virtualmente todas as superfícies expostas ao ambiente externo (boca,
tratos genitourinário e respiratório, olhos e pele), a maior parte da
colonização (cerca de 70%) ocorre no trato gastrointestinal, onde têm
como papel auxiliar na digestão de alimentos, na síntese de vitaminas e
controlar a proliferação de patógenos aos quais somos constantemente expostos.
Entretanto, além de importante papel na homeostase e proteção dos órgãos em que
se encontram, estudos recentes sobre o microbioma humano demonstram que sua
influência se estende muito além do intestino, inclusive para o cérebro.
Durante os últimos 10 anos, estudos ligaram o microbioma intestinal a uma série
de comportamentos complexos, como humor e emoção, apetite e saciedade, e até
mesmo aprendizagem e memória. Não só a microbiota parece interferir na função
cerebral, mas também pode influenciar o risco de transtornos neurológicos,
incluindo ansiedade, autismo e Doença de Parkinson. A grande questão é como? Parte
dessa questão pode ser respondida baseando-nos no fato de que populações
microbianas são capazes de metabolizar e converter parte dos componentes da
nossa dieta em substâncias que atuam diretamente sobre células do sistema
nervoso central e periférico, como ácidos graxos de cadeia curta e triptofano.
Dependendo da composição da microbiota de cada indivíduo, que em geral é muito
variável e depende dos hábitos alimentares, de higiene e de fatores genéticos,
essas substâncias podem ser produzidas em maiores ou menores quantidades,
induzindo respostas que podem levar ao desenvolvimento de determinadas doenças.
Um estudo recente, publicado no fim de 2016 na revista Cell (doi:
10.1016/j.cell.2016.11.018), demonstra, por exemplo, que camundongos germ free, ou seja, que não possuem
microbiota, não desenvolvem doença de Parkinson. Isso porque os ácidos graxos
de cadeia curta produzidos pela microbiota são extremamente importantes na
ativação de células da micróglia e sem essa ativação diferencial dessas células
a doença não evolui. Além disso, camundongos que receberam transplante fecal de
indivíduos com doença de Parkinson apresentaram aumento dos níveis séricos de
ácidos graxos de cadeia curta e desenvolveram os sintomas da doença de maneira
mais rápida que animais que receberam o transplante fecal de indivíduos
saudáveis. Dados semelhantes foram encontrados em outros trabalhos que
investigaram o papel da microbiota em indivíduos com autismo e esquizofrenia,
demonstrando que algumas espécies de bactérias comensais também estão alteradas
nos portadores destas síndromes. Embora poucos mecanismos tenham sido bem
delineados na relação microbiota/hospedeiro/doenças neurológicas, estes estudos
iniciais geram grandes expectativas, uma vez apontam a modulação da microbiota
como uma possível ferramenta terapêutica para o tratamento dessas desordens que
acometem grande parcela da população e não possuem tratamentos efetivos.
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